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20 anos

12-06-2014 | 04:16
Por Liga Nacional de Basquete

No dia 12 de junho de 1994 a seleção brasileira de basquete feminino conquistou a última medalha de ouro do Brasil em um Mundial; confira a trajetória e a história

Posada

No dia 12 de junho de 2014, o Brasil comemora os 20 anos da conquista da medalha de ouro no Campeonato Mundial de Basquete Feminino da Austrália (Arquivo/CBB)

AS DÚVIDAS

As chances eram mínimas. Apesar da constante presença na história dos campeonatos mundiais de basquete feminino, a seleção brasileira não passava por uma boa fase. Nos anos anteriores àquele 1994, o país amargurara a 10ª posição na edição de 1990 e 11ª em 1986. Mas o impossível aconteceu e do outro lado do mundo, na Austrália, o Brasil subiu ao ponto mais alto do pódio no dia 12 de junho.

Muitos não acreditavam que isso aconteceria. “Éramos muito questionados quando entramos na competição. A comissão técnica era jovem e ainda tinha o agravante de que não conhecíamos as atletas, porque eu trabalhava no Rio de Janeiro com times masculinos”, conta Miguel Ângelo da Luz, técnico da seleção naquele campeonato.

Um dos maiores questionamentos, principalmente por parte da imprensa, era sobre a competência do treinador para comandar um time que contava com nomes como Hortência Marcari, Magic Paula e Janeth Arcain. O receio também chegou às jogadoras.

“Quando saiu a convocação e vimos o nome do Miguel Ângelo da Luz nossa pergunta foi ‘quem é ele?’. Não o conhecíamos. Ele era do Rio de Janeiro e basicamente todas nós da seleção éramos de São Paulo. No começo foi estranho, mas ele teve muita sabedoria”, afirmou Hortência. Segundo a ala, o respeito que tanto atletas como técnico tinham um pelo outro foi o que tornou possível o bom desenvolvimento das engrenagens.

O TIME

A união fez a força (Arquivo/CBB)

A união fez a força (Arquivo/CBB)

“Sempre respeitamos a hierarquia, mas ele também soube nos ouvir. Durante os treinos nós o ajudávamos dentro de quadra, porque, como jogadoras, tínhamos uma leitura e ele tinha outra. Se passava uma jogada e víamos que dava para fazer diferente, dávamos nossas opiniões, pois já jogávamos juntas há muito tempo. E ele foi muito sábio em nos ouvir. Nós o respeitávamos muito”, prosseguiu a cestinha daquele campeonato.

O elenco brasileiro tinha como base nomes do torneio de 1990. Hortência, Paula e Janeth formavam o eixo principal da equipe e tinham ao seu lado as antigas companheiras Roseli, Ruth e Simone. Para o Mundial da Austrália, Alessandra, Helen Luz, Adriana dos Santos, Dalila, Cintia e Leila foram acrescentadas.

As mais experientes, Hortência e Paula, eram a força do grupo. Ambas já haviam participado de outras edições do Mundial e encontraram nas companheiras apoio para o talento nato que tinham em quadra. Janeth, outro nome que já marcado, estava em sua segunda aparição no torneio internacional, mas metade do grupo era de novatas.

“Nós fomos uma equipe especial. O ouro foi um feito que a Paula e a Hortência já estavam perseguindo há muito tempo e a junção daquelas mais novas, que vieram para complementar, foi o que deu o resultado. Eu era uma moleca ainda”, falou Alessandra Oliveira, pivô que estava em seu primeiro Mundial e colecionou médias de 6,4 pontos e 5,8 rebotes por jogo.

Janeth não discorda da pivô: “O mix de geração que teve naquela competição ajudou muito a balancear o time e conseguir esse título”.

O espírito de coletividade também foi um fator essencial para a conquista do resultado. “Tínhamos um relacionamento maravilhoso. O senso do coletivo estava acima da genialidade e do talento individual. Sabíamos que para vencer todas teriam que cumprir bem sua função”, afirmou Paula.

Até mesmo a estrela do time, Hortência, que já havia sido cestinha de campeonatos mundiais três vezes e tinha um retrospecto de muitas vitórias focava não em si, mas no grupo. “A Hortência foi fundamental no nosso elenco. Ela é uma vitoriosa e a carreira dela mostrou isso. Sempre conseguia marcar a maior jogadora na parte ofensiva do time adversário. Por sua experiência, sempre passava coisas novas para as jogadoras novas, sobre as competições das quais ela já havia participado. Isso faziam ela e a Paula”, conta Miguel Ângelo da Luz.

O CAMINHO

A busca pelo troféu de campeão começou no dia 2 de junho. Na fase de classificação, o Brasil tinha como adversários no Grupo C a Eslováquia, a Polônia e a China Taipé (nome utilizado por Taiwan em competições oficiais). Nessa primeira etapa, não foi o líder do seu grupo.

O esquadrão brasileiro venceu a China Taipé por 112 a 83 em seu primeiro confronto. Janeth Arcain foi o destaque inegável da partida, com os incríveis números de 23 pontos, 18 rebotes e seis assistências. O primeiro revés veio em seguida.

Contra a Eslováquia, o Brasil sofreu a derrota por 99 a 88, apesar dos 27 pontos de Hortência e dos 18 tentos positivos mais oito rebotes de Janeth. A recuperação veio no jogo seguinte, através da vitória por 87 a 77 contra a Polônia.

Os resultados classificaram a seleção em segundo lugar no Grupo C para as quartas de final, enquanto a Eslovaquia ficou em primeiro. As coisas começaram a complicar nessa etapa e o Brasil tinha todas as desculpas para encerrar sua participação ali.

A má colocação nos últimos mundiais era uma delas, mas outra falava ainda mais alto. Em toda a história do torneio internacional, apenas duas equipes haviam conquistado a mais alta posição do basquete feminino: União Soviética (seis vezes) e Estados Unidos (cinco vezes). Em 1994, a Guerra Fria já havia acabado, e o bicho-papão norte-americano era o adversário a ser vencido. Mas ainda não seria agora que esse confronto aconteceria.

Na comemoração da vitória contra os Estados Unidos, a emoção era o maior sentimento (Arquivo/CBB)

Na comemoração da vitória contra os Estados Unidos, a emoção era o maior sentimento (Arquivo/CBB)

Primeiro, o Brasil passou por Cuba, por 111 a 91. Depois, novamente, perdeu. Desta vez, para a China, por 97 a 90. Hortência marcou 32 pontos no encontro inicial com suas futuras adversárias da decisão. O terceiro e último duelo das quartas de final foi torturante. Contra a Espanha, a seleção encontrou dificuldades no início e permitiu que uma grande vantagem fosse imposta pelo time da Península Ibérica. A virada, porém, aconteceu. Foi nesse jogo que Janeth arremessou 20 lances livres e acertou 18.

Os resultados permitiram que o Brasil passasse para as semifinais e o seu adversário na luta pelo lugar na final seria o temido Estados Unidos.

Enfrentar o principal time do mundo seria, certamente, o maior desafio do elenco brasileiro nesse campeonato mundial. E o desafio, além de ter sido aceito, foi muito bem realizado. Defesa e ataque estavam sincronizados. Os erros diminuíram, os contra-ataques foram muito bem aproveitados e o equilíbrio foi mantido, com o placar definido nos últimos segundos: 110 a 107.

A vitória foi comemorada como um título. E essa era a sensação da equipe. “Desde o momento que vencemos a Espanha e então derrotamos os Estados Unidos eu tinha convicção de que o título era nosso. A China chegou na final sabendo que tínhamos derrotado a seleção norte-americano e sabia o que isso significava”, afirma o técnico Miguel Ângelo da Luz.

E a previsão foi correta. Na final, o Brasil derrotou a China por 96 a 67, quebrou tabu e se tornou o único de três países a se tornar campeão mundial.

LEGADO

Vencer o Campeonato Mundial de Basquete Feminino de 1994 foi muito mais do que ganhar um torneio internacional para a seleção brasileira. “A sensação que eu tenho quando lembro desse título é de que graças a Deus, aos 46 do segundo tempo, conseguimos marcar uma geração. Se você não é campeão do mundo, você não marca uma geração. É algo que fica na história e ninguém pode tirar”, afirma Hortência, sem precisar esconder o orgulho pelo feito. “Nosso país quebrou a hegemonia da União Soviética e dos Estados Unidos. No final, foi uma sensação de alívio. Finalmente, eu havia conseguido ser campeã do mundo”, conclui a ex-jogadora.

A emoção não foi diferente para Paula, que define o momento da mesma maneira que é chamada: mágica. “Ser campeã do mundo, especialmente como uma das únicas quatro seleções do mundo a conseguir isso, é uma sensação de dever cumprido e de que toda a dedicação foi recompensada. Foram quase vinte anos para chegar neste momento mágico”.

O Brasil passou de uma seleção completamente desacreditava para a maior posição do mundo na modalidade. “Quando estávamos indo para a competição ninguém acreditava em nós. Antes da viagem eu tinha uma coletiva à imprensa e nesse evento um jornalista perguntou qual era a minha expectativa para a competição e eu respondi que seríamos campeões”, lembra Miguel Ângelo da Luz. “Mais uns três jornalistas estavam por ali. Um cutucou o outro e riu. Aí veio outro e perguntou se eu sabia das últimas posições do Brasil nos campeonatos mundiais – e sim, eu sabia que havíamos ficado em 11º e 10º lugar nas duas últimas edições. Então, ele perguntou se eu tinha alguma mágica. Eu disse que não, que a minha mágica era o meu trabalho. Os jornalistas debocharam de mim. Depois, quando voltamos da competição, campeões, teve uma festa de comemoração em uma casa de shows e esse jornalista estava lá. Ele veio até mim e pediu desculpas pelo que havia dito”, conclui o técnico.

Pela garra das jogadoras, pelo incrível trabalho realizado por Miguel Ângelo da Luz e pela batalha vencida pela seleção brasileira de basquete feminino, a Liga Nacional de Basquete parabeniza as campeãs e todos os envolvidos nesse belíssimo capítulo da história do esporte no Brasil!

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