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Copa Super 8 / NBB Caixa

Desafio gigante

21-01-2024 | 01:51
Por Juvenal Dias

Em entrevista, técnico Paulo Jaú conta como foi passar do sub-13 de Jacareí ao time principal do Bauru Basket em apenas dois meses e ainda classificar a equipe à Copa Super 8

Em dois meses, a vida de Paulo Cézar Martins de Oliveira, ou simplesmente Paulo Jaú, mudou completamente. O treinador passou do time sub-13 da Prefeitura de Jacareí ao comando de uma das equipes mais tradicionais do basquete brasileiro, o Bauru Basket, substituindo ninguém menos que uma lenda das pranchetas, o técnico Guerrinha. Foi uma trajetória inesperada e uma escolha mais difícil do que pode parecer.

“Foi muito difícil tomar essa decisão. Com a ajuda da família, da minha esposa e meu filho, que falaram que poderia ser uma grande oportunidade aparecendo, eu vim para o Bauru Basket como assistente técnico. Eu já tinha perdido mercado, poderia até aparecer outra chance, como poderia não aparecer mais. Precisei conversar na Prefeitura (de Jacareí), também com os pais dos atletas (do time sub-13), explicar que não estava indo pelo status ou por dinheiro, mas pelo projeto que iria alavancar minha carreira. Todos, inclusive as crianças, entenderam, mas foi uma coisa que me tocou muito de tomar essa decisão de ‘largar’ as crianças, porque eu pregava uma coisa e acabei não cumprindo aquilo que eu falava todos os dias. Vim parar aqui e aconteceu essa transição do Guerra de se afastar das quadras, depois de dois meses”, revelou o treinador.

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Inicialmente, Paulo Jaú, que completa 49 anos neste domingo (21/1), foi anunciado como auxiliar técnico do Bauru Basket em agosto de 2023. Em outubro do mesmo ano, virou o head coach para comandar o time no NBB CAIXA 2023/24, após o técnico Guerrinha deixar o cargo. Mesmo tendo assumido a equipe de forma inesperada e com a temporada em andamento, o técnico conseguiu alcançar a primeira missão do ano: a classificação para a Copa Super 8.

Jaú sabe o tamanho da responsabilidade que tem nas mãos: “Estou tendo a oportunidade, é o maior desafio da minha carreira estar à frente do Bauru Basket. É um projeto muito grande e com uma história muito bonita”.

Paulo Cézar Jaú, na época de técnico do São José. Foto: Arquivo

Tem um ditado que fala: “Cavalo selado só passa uma vez, ou você monta ou fica a pé”. Paulo Jaú não só montou, como assumiu as rédeas do comando do cavalo, ou melhor dizendo, do Dragão. O treinador nasceu em Cachoeira Paulista, mas carrega o apelido Jaú que veio na época de escola, pois é o bairro onde mora até hoje, na cidade próxima de Jacareí. Na infância, ele não gostava tanto de basquete e até escondia as bolas laranja para jogar futebol. Mas depois de algumas broncas no colégio e puxões de orelha do pai, foi obrigado a praticar a modalidade e foi tomando gosto. Não chegou a fazer uma carreira como atleta efetivamente, competiu no interior paulista apenas em categorias de base.

Logo, a real aptidão para comandar veio ao ingressar na faculdade de educação física. Se formou em Mogi das Cruzes e teve oportunidades em Campos do Jordão e São José, em categorias de base. Depois de 12 anos, tornou-se assistente de Régis Marrelli no time adulto do São José Basketball. Régis é o grande mentor para Jaú, que o considera uma referência e, sempre que é possível, solicita seus conselhos. A parceria durou oito anos e rendeu dois Campeonatos Paulistas e o vice-campeonato do NBB CAIXA 2011/12. A dupla foi dispensada ao final da temporada seguinte e Paulo foi treinar as categorias de base de Taubaté por quatro anos. Regressou como treinador do time principal de São José para conquistar o vice-campeonato da Liga Ouro, em uma final épica de quatro prorrogações contra o Corinthians. A pandemia interrompeu o projeto e Paulo voltou a ser assistente na UNIFACISA e no Caxias do Sul Basquete, com os técnicos Filet (Felipe Luiz Santana) e César Guidetti, respectivamente.

Até julho de 2023, tinha retornado ao ponto inicial e treinava seus “monstrinhos”, como ele carinhosamente chamava seus jovens atletas da base de Jacareí. Todos os dias Jaú pregava que gostaria que seus comandados ficassem juntos por muitos anos. Mas a saída de Rodrigo Silva do Bauru Basket para ir a Santa Cruz do Sul abriu uma vaga de auxiliar técnico e o próprio Rodrigo indicou o nome de Paulo Jaú como substituto. O nome agradou a diretoria e a negociação durou alguns dias, até que Jaú pudesse se despedir de seus discípulos do sub-13 de Jacareí.

No entanto, o plano inicial de ser assistente do experiente e rodado Guerrinha se transformou na chance de comandar Alex Brabo, Larry Taylor e companhia. Sob Jaú, o Dragão está invicto dentro do Ginásio Panela de Pressão no NBB CAIXA 2023/24. O rendimento em casa foi determinante para que Bauru garantisse a oitava e última vaga à Copa Super 8, que rendeu um confronto com o Flamengo, no dia 28 de janeiro, às 16h, pelas quartas de final da competição. O torneio é a primeira chance de Paulo Jaú levantar um título nacional como treinador principal de um dos times mais tradicionais do basquete brasileiro.

Em entrevista à Liga Nacional de Basquete, Jaú falou sobre essa trajetória. Confira o bate-papo com o técnico do Bauru Basket:

Liga Nacional de Basquete: Como foi sua chegada ao Bauru Basket?

Paulo Jaú: Na conversa que tive com o Vanderlei (Mazzuchini – Supervisor do time) e com o Guerra não me prometeram nada que eu seria o técnico futuramente. Eu viria para ser assistente do Guerrinha. Já estava um pouco desencanado dessa situação. Mesmo quando fui assistente do Régis durante os oito anos, eu não tinha a pretensão de ser um head coach. Eu queria ser o melhor assistente possível, um profissional capaz e leal ao técnico principal. Eu não almejava amanhã ou depois esse posto. Eu queria ser o melhor assistente que a Liga poderia ter. Tanto que, quando tive o convite em São José para ser o técnico, conversei muito com o Régis sobre isso. Ele comentou: “você se preparou, já sabe como é, qual é o caminho”.

LNB: E como lida com a situação de transição entre diferentes cargos, de treinador de base, passando por assistente, até treinador principal?

PJ: Não vai ser fácil. Quando é um ex-jogador de renome teria um apelo maior e eu não tenho esse apelo. Mas eu já tinha experiência de estar na Liga há muito tempo e trabalhar com grandes atletas. Aí aceitei essa oportunidade. Ao ir para Bauru, trabalhar com o Alex, com Larry Taylor e outros grandes jogadores, eu já sabia, eu queria ser assistente. Tal como o Hudson foi com o Guerrinha ou o próprio Rodrigo. Daí, apareceu essa situação do Guerra. Pensei: “conhecer o processo, eu conheço, sei como lidar. Preparado também, porque já estive nessa função. Sei que o desafio é outro, a cobrança é outra, os investimentos são outros e o Bauru era o atual campeão da Liga Sul-Americana”. Move muita gente, a torcida é apaixonada, nosso ginásio vive lotado. Eu me tornei o head coach, mas eu me preparei. Não tinha essa ambição, mas, com o passar dos anos, vai adquirindo essa maturidade e essa casca para que, uma hora, se tiver que assumir, ter as condições. É continuar estudando, continuar aprendendo no dia a dia, ouvir os atletas, dividir com eles e com sua comissão técnica. Ter uma comissão experiente e competente dá essa segurança de estar à frente do Bauru Basket hoje.

Treinador Paulo Jaú passando instruções à equipe do Bauru Basket. Foto: Andrews Cleyton / Bauru Basket

LNB: Como foi o momento em que o Guerrinha deixou o comando da equipe em suas mãos?

PJ: Na semana em que estava para acontecer, o Guerrinha já estava dando umas aberturas que ele poderia sair. Na minha cabeça, achava que ele faria isso ao final da temporada e não naquele momento. Ele já me dava muita liberdade para tomar frente nos treinos e tomar decisões. Acho que ele estava me preparando para assumir esse cargo. No dia da transição, na reunião, foi muito tranquilo. Senti todo o apoio do Guerrinha naquele momento, do Vanderlei e diretoria e também dos atletas. A liderança do Alex e do Larry, o fato de já ter trabalhado com outros jogadores, se tornou bem tranquilo, eles receberam bem e me acolheram, entenderam a proposta. Quando assumi, falei: “tenho meu jeito, meu pensamento, não vou de uma vez, mas vou propondo aos poucos a forma como o Jaú gosta do basquete”. E não porque o que o Guerrinha estava fazendo era errado. Só conceitos diferentes. Nós nos respeitávamos dentro disso. Eu precisava fazer alguns ajustes que eu acreditava para melhorar. Mas sempre foi em conversa com a comissão técnica, com o próprio Vanderlei, com os jogadores. Sempre fui muito aberto para receber informações, mesmo que não seja aquilo propriamente que eu gostaria de ouvir. Eu prefiro ouvir. Em um grupo, não tem de quem é a ideia, mas sim executá-la e dar certo. Até porque estou lidando com pessoas que têm histórias muito grandes no basquete. Então a relação é muito boa com o grupo, principalmente com as lideranças.

LNB: Na atual temporada do NBB CAIXA, vocês acumularam 10 vitórias em casa e houve um momento inicial em que não venciam fora. Foram sete partidas até a primeira conquista longe do Panela de Pressão. Era um fato que incomodava?

PJ: Tínhamos sempre muito claro que estávamos jogando muito bem dentro de casa e fora de casa não estávamos mal. Tínhamos oscilações dentro do jogo que aconteciam na hora crucial de fechar o jogo. A gente identificou isso e sabíamos que uma hora iria encaixar. Não era um incômodo para nós. Teve a chegada do (pivô Jeremy) Hollowell, que deu uma consistência maior e uma profundidade melhor para o elenco. Tivemos que fazer algumas alterações de jogo dentro das partidas, mas não estávamos preocupados. Nós adquirimos certo padrão de jogo, não é porque perdíamos fora que estava errado. É um processo. Veio a primeira vitória contra Mogi lá, na última bola, prorrogação… Depois veio um grande jogo contra o São José, fizemos uma apresentação belíssima como equipe. Ali a equipe ganhou mais corpo, depois de Franca, vieram São Paulo e Paulistano e o processo vai caminhando gradativamente.

Paulo Jaú é o quarto da esquerda para direita na comissão técnica junto com o time do Bauru, no Ginásio Panela de Pressão. Foto: Bryan Assis/ Bauru Basket

LNB: Falando em Panela de Pressão, como é jogar em um ginásio de nome tão sugestivo e com tanta história no basquete nacional?

PJ: O ginásio do Panela de Pressão é um lugar histórico no meio do basquete, onde revelou Leandrinho. Aqui você vai encontrar um ambiente hostil, dentro dos limites da educação da torcida. É um torcedor apaixonado pelo Bauru Basket, mas que não desrespeita o visitante. O fato é que aqui a panela realmente ferve, é bonito de ver a paixão que o torcedor tem, não só pelo time, mas por consumir os produtos do Bauru Basket. É muito importante mostrar força dentro da sua casa. Quanto maior essa força, mais engajamento do torcedor com o Bauru e com a modalidade do basquetebol. Nós temos essa identidade, com isso podemos avançar bastante no NBB CAIXA. Mas agora temos que decidir fora, pois não conquistamos uma melhor colocação e aquela sequência de jogos fora que não vencemos, vamos pagar na Super 8.

LNB: Já que comentou sobre a Super 8, você pensava que poderia conquistar uma classificação entre os oito melhores times do primeiro turno já na primeira temporada comandando o Bauru Basket?

PJ: A verdade é que nós não estávamos focados na questão da Super 8. O que a gente sabia é que na montagem do elenco que tínhamos, sabíamos da dificuldade que enfrentaríamos, equipes com um aporte financeiro maior, equipes que já estavam juntas há mais tempo, times que estavam em um bom momento, tipo o Pinheiros, que tinha feito um grande Campeonato Paulista, assim como o Paulistano, que foi campeão. Se fosse colocar na balança, nós teríamos que remar muito para pensar em Super 8. Não trabalhamos pensando na Copa. Primeiro era dar um padrão para a equipe, ser consistente dentro de nossa casa, fazer o torcedor acreditar na nossa equipe. Depois, quando começamos a visualizar na tabela, que pensamos que dava para chegar.

LNB: Por ter classificado com a oitava colocação, o Bauru Basket entra na Copa Super 8 como um azarão?

PJ: Não digo azarão porque a história do Bauru Basket é muito grande. Jamais dá para pensar que o Bauru seja azarão em competição alguma. Talvez não esteja vivendo seu melhor momento, mas nunca será azarão devido a sua história. Vamos jogar contra o Flamengo, na casa deles, mas seremos uma equipe competitiva como vem sendo no NBB CAIXA. Vamos mostrar o que o Bauru é no campeonato nacional hoje: jogando em alto nível contra todas as equipes, tendo altos e baixos como todos os times estão apresentando.

Paulo Jaú, com sua energia, para incentivar o time. Foto: Wilian Oliveira/ Foto Atleta

LNB: Como são as características do treinador Paulo Jaú e do time que ele comanda?

PJ: Sou um profissional que estuda bastante, consumo muito basquete. Mas sou um cara que procura dividir com o grupo as responsabilidades. Todas as decisões que tomamos e que são importantes, é partilhado com o grupo. Aprendi isso no decorrer dos anos que, quando você divide o peso, todo mundo sai ganhando. Sou muito enérgico na beira da quadra, muito espontâneo, mas procuro trabalhar e dividir as responsabilidades, não só com os atletas, mas também com nossa comissão técnica, com os principais jogadores. Dos jovens, gosto de ouvir. Quando acaba o jogo, gosto de conversar com algumas pessoas, o Régis é uma delas, ou mesmo gente de fora que possa ter uma crítica que nós não observamos. A característica do meu time é ser sempre muito aguerrido, de muito espírito, muita luta e muita entrega. Na beira da quadra, procuro entregar tudo o que posso para fazer um bom trabalho.

LNB: Você comentou bastante sobre o Régis Marrelli. É sua maior referência como técnico? E deu para aproveitar o convívio com o Guerrinha?

PJ: O Régis é minha maior referência, como profissional, como amigo, como pai. Ele é muito diferente. Hoje mesmo conversamos por conferência por mais de 40 minutos. Por onde ele passa, deixa a marca de referência do trabalho dele. Do Guerra não deu muito tempo para absorver ensinamentos. Ele tem um jeito diferente do meu de lidar com o grupo. Falei para ele que não consigo deixar um jogo mais solto, com mais liberdade. Se eu fizer isso, perco o controle do time. Isso também diz da experiência dele, por quantos grupos já passou? Em certo ponto, ele tem razão, não dá para segurar tanto, é preciso deixar fluir. Isso vem com mais segurança em seu próprio trabalho.

LNB: Qual é seu recado final para a torcida do Bauru Basket e para os fãs do NBB CAIXA?

PJ: Para o torcedor do Bauru, que continue nos incentivando, indo ao ginásio, empurrando a equipe. Hoje, o time está vivendo um bom momento, mas vai passar por altos e baixos, como todas as equipes. É preciso ter tempo, trabalho e paciência para colher alguma coisa lá na frente. Ninguém colher nada repentinamente, da noite para o dia. Também sou muito grato ao Bauru Basket por estar hoje à frente do time. Repito que é o maior desafio da minha carreira, estou aprendendo muita coisa, coisas que eu não via quando estava em outros clubes, é muito bacana essa oportunidade. Para quem gosta da Liga e do NBB CAIXA, quanto mais estados nós tivermos oportunidades e espaços de basquete de qualidade, trazendo jogadores estrangeiros de bom nível e revelando jovens, melhor será. A Liga Nacional de Basquete está de parabéns, toda a diretoria e staff por organizar o maior campeonato do país, sendo competitivo, com um nível muito bom.

O NBB CAIXA é uma competição organizada pela Liga Nacional de Basquete com patrocínio máster da Caixa Econômica Federal e Loterias Caixas, parceria do Comitê Brasileiro de Clubes (CBC) e patrocínios oficiais Sportsbet.io, Penalty, EMS e UMP e apoio IMG Arena, Genius Sports, EY e NBA.